O sangue jorrava bem roteirizado do pescoço de um Brutus muito bem interpretado e dirigido, quando repentinamente, o telefone tocou.
Pausa.
Olhares indagadores.
Num raio ela,
“eu não estou” me passando o telefone.
Cumprimentos rápidos e uma historia naquele instante um tanto quanto incompreensível e destoante em qualquer coisa que a urgência em voltar à Roma não permitia visualizar com clareza.
Com rapidez conseguiu se desenlaçar daquela historia de cabeça-quebrada.
Antes do play ela franziu o cenho e com olhar arqueado indagou sem palavras, eu respondi rapidamente, “Joyce perdeu seu par de escarpam”.
Ela entortando a boca grunhiu “ah...”
Então voltamos à Republica dos Césares, para despudoradamente suspirarmos na nudez bela e masculamente arrogante do Marco Antonio, ali, todo bem da cabeça aos representados pés.
Depois de muito sangue, corrupção, matança, vingança, maldição e luxuria, nós estávamos cada uma com a sua alma leve o suficiente para irmos dormir com aquela sensação de quem descarregou uma alta dose de adrenalina e inspira profundamente o deleite do prazer, nos despedimos e fomos para nossos mundos secretos.
Foi então que eu disse, “é preciso visualizar melhor a cena sem pés na minha cabeça”, e liguei para aquele amigo acolhedor de pobres moças indefesas, soltas por motivos variados, como variedades das ruas.
Vulneráveis.
Ele gaguejou procurando as mesmas palavras da primeira versão.
Eu não acreditei em nada, mas também sei mentir com aquela sinceridade de sempre, e ele passou o telefone para a Joyce.
Sua voz tinha o tom educadamente doce de moça bem nascida, ou era apenas uma mera exceção fazendo parte da exclusão.
Suave.
Contou-me em manhosas interpretações sofríveis, que havia sido assaltada, e que ela precisava de um novo par de escarpam.
Joyce precisava mesmo era de se tornar uma aspirante aprendiz de um bom teatro, mas ela soava inseguramente,
Amadora.
Eu precisei contar até dez, quando cheguei ao quinta parte do suportavel eu descarreguei, em voltagem amena, que em meu armário ela não encontraria nada que combinasse com pesinhos acostumados à maciez elegante de um escarpam.
Mas não sei por que, tive a impressão de que Joyce, por motivo qualquer que na minha cabeça não tinha pé, simplesmente queria ou precisava me ver.
Não insistiu.
Pareceu-me que algo de coragem lhe fugiu quando ela me ouviu, ou foi apenas o meu tom de desconfiança que soou muito como muro de proteção adornado com cerca viva;
Não sei, desisti.
Em todo o caso Joyce atiçou minha curiosidade sóbria, e eu gostaria de continuar a historia...
É que a Joyce tem meu telefone, e já sabe em que lado do lugar com muitos jardins, eu moro.
No céu Um léu sem gosto Um olho de um rosto do qual já o )Olhar a espreita deita uma glosa num sorriso( Como um respiro de pétala vermelha Na boca erótica soltando um Cândido ...hahaha...
Acordou na sua solidão ainda sonolenta, pensando em pequenos ruminantes pastando sapiências e espinhos contemporâneos.
A ambígua língua da Mídia salvando tudo, até mesmo os pecados do mundo, reciclando, moldando, distorcendo, reinventando, contando, condenando, absolvendo, e mostrando, e mostrando... Tudo em nome da Evolutiva formação de opinião.
Ainda assim, e apesar do frio saboreando a preguiça era preciso levantar, e sem um horizonte onde pudesse buscar na cor da barra do dia uma previsão climática possível, olhou pela janela na direção onde nascera o sol por hora encoberto, e alegrou-se em ver tons luminosos por trás de nuvens brandas, era um dia quase branco-gelo, mas havia por ali uma promessa morna de luz quente.
Então tomou um banho apenas com a frieza quebrando-se amornada sobre os poros ainda adormecidos, pensou na noite em que viria e queria estar com disposição para sair, sorrir, ver... Mundos vívidos, ou apenas seus intérpretes de outras vivências.
Tantas ciências e seu mundo guardado em contidas inconstâncias que precisavam também ser verbalizadas.
Saiu do banho apostando na luminosidade aquecendo suas entranhas e suas estranhas sensações, dando-lhe algum ânimo, então exagerou no minimalismo das roupas e foi à padaria, curtindo o olhar espantado das pessoas, e para espanto seu, o espanto era geral e então olhou mais uma vez para o céu buscando um apoio, bruscamente entendeu porque apesar do ânimo, sentia tanto frio.
A resposta chumbava o céu e não havia sinal de possível volta de luz, ao menos, não por horas adiante.
Voltou para casa quase correndo e não olhando para ninguém, para que ninguém captasse o ridículo estampado em seu semblante trêmulo. Mas em nenhum momento se encolheu.
Entrou, passou um café e vestiu mais duas peças aquecendo também os pés.
Abriu o jornal sem muito interesse, leu apenas as chamadas, tanta mesmice que pulou para as notícias do “cotidiano”, onde um homem entendido de Leis é flagrado corrompendo corpos adolescentes de – “pobres” - crianças.
Teve vontade de cuspir para expiar sua repugnância, mas havia tantos lados de uma mesma história que resolveu lembrar-se de que a vida é um emaranhado de escolhas, e o mundo é feito por humanos corrompidos, terminou seu café e começou a trabalhar pensando na solidão dos seus atos às escondidas dos ruminantes...
(...) este é o espaço negro onde deixo eternizada a loucura da minha alma. Pode ser que em meio a um surto eu apague tudo, e nenhuma luz minha seja vista. Porque às vezes eu sinto necessidade de me apagar, me excluir, sem aviso prévio, e sem explicações que levem a detalhes corrosivos. Obrigada a quem tem vindo aqui.